segunda-feira, 18 de junho de 2018

Entrevista com Arnaldo Jardim

“O Brasil possui uma das legislações mais exigentes do ponto de vista de preservação ambiental do mundo”, diz Arnaldo Jardim

Por Germano Martiniano
Ex-secretário de Agricultura e Abastecimento do estado de São Paulo, o deputado federal Arnaldo Jardim (PPS-SP) conversou com a Fundação Astrojildo Pereira (FAP) sobre o tema agricultura, que sempre dividiu opiniões em todo o Brasil. Sabe-se que ela foi o “carro-chefe” do país, começando pela cana-de-açúcar, ainda na colonização, depois o café, que sustentou a transição da monarquia para a República do café com leite (1889-1930), por exemplo. Atualmente, produzindo diversos produtos, da soja a carne, o Brasil continua tendo na produção e exportação de produtos primários uma base relevante de sua economia. Ao mesmo tempo, o setor enfrenta muitas críticas no que concerne à degradação ao meio-ambiente.
Arnaldo Jardim é o entrevistado desta semana da FAP Entrevista, série que está sendo publicada aos domingos com intelectuais e personalidades políticas de todo o Brasil, com o objetivo de ampliar o debate em torno do principal tema deste ano: as eleições. Engenheiro civil de formação, Jardim que há certo “excesso de realismo” em relação as críticas que se fazem sobre agricultura destruir o meio-ambiente. “Organizações internacionais que falam sobre a Amazônia ignoram o fato de que o Brasil ainda tem 50% do seu território de cobertura vegetal nativa”, informa. Na entrevista à FAP, ele também fala sobre o nosso perfil agroexportador: “Não há como pensar em desenvolver todos os setores do Brasil para que todos possuam um processo de industrialização e agreguem valor”.
Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista:
FAP Entrevista – A greve dos caminhoneiros é passado, ou ela ainda deixa “feridas” na economia e população brasileira?
Arnaldo Jardim – A greve dos caminhoneiros, como você citou, deixou feridas na economia e na sociedade brasileira. Primeiro, porque foi uma reação a uma situação que vários fatores se conjugaram: excesso de oferta de caminhões; adequação da política de preços da Petrobras ao mercado, que do ponto de vista do mercado é satisfatória, mas do ponto de vista social se ignorou uma oscilação de preços de acordo com o dólar, que impactou o bolso do consumidor brasileiro; por fim, a maior ferida que fica é a institucional, que revelou um governo absolutamente frágil, incapaz de prevenir, comandar e dar respostas às demandas sociais.
E o setor agroexportador como ficou? Qual foi o real prejuízo ao setor?
A greve causou um impacto muito grande devido à interrupção do fluxo e pelo fato de que com a objetiva elevação de custos do setor não tem exatamente como incorporar estes custos a negociações já feitas de valores das exportações há muito tempo. Portanto, com isso os cálculos variam, falam em perdas de 12 bilhões de reais, porém são números a serem analisados com mais calma. O problema é que isto incorporou uma instabilidade de mercado que os concorrentes internacionais podem se aproveitar e caracterizar como descumprimento de contratos. Ou seja, nossa imagem fica um pouco abatida.
Durante a greve, a discussão do modelo de transporte de cargas e de pessoas voltou à tona no Brasil. Qual sua opinião sobre o nosso atual modelo de transportes baseado em caminhões e carros em detrimento de trens e transportes públicos de qualidade?
A questão da discussão matriz de transportes, modal rodoviário no caso, que é absoluto no Brasil, pode-se dizer que é um meio muito concentrador daquilo que é hoje nossa capacidade de transportar pessoas e cargas. Portanto, existe a necessidade de ampliar, primeiro, a integração de modais e segundo, especificamente, os modais ferroviários e hidroviários.
O senhor acha que nossa “vocação” histórica agroexportadora fez com que deixássemos de produzir produtos de maior valor agregado?
Há uma discussão sendo feita pelos economistas do que significa exatamente um país exportador de commodities ou um país exportador de produtos industrializados ou semi-industrializados. A lógica intuitiva de todos obviamente é de que um país que agregue valor, por exemplo, ao invés de vender a soja venda o farelo ou óleo, isso parece natural e penso que o Brasil deveria pensar em completar cadeias de produção. Contudo, acho que precisamos trazer para o debate, dentro de um projeto nacional, discutir exatamente em quais setores nós temos vantagens competitivas e comparativas internacionais para fazermos toda cadeia, sendo vanguarda de conhecimento nesta área. Não há como pensar em desenvolver todos os setores do Brasil para que todos possuam um processo de industrialização e agreguem valor. Em alguns casos é mais barato comprarmos algo importado do que pensarmos em produzir aqui.
Muitas criticas são feitas ao setor agropecuário devido ao estrago que se faz ao meio-ambiente, desmatamento, desgaste do solo, emissão de CO2, etc. Existem leis e conscientização por parte dos agricultores para se crescer de maneira sustentável?
Aqui no Brasil, às vezes, somos mais realistas do que o rei. Por exemplo, organizações internacionais que falam sobre a Amazônia ignoram o fato de que o Brasil ainda tem 50% do seu território de cobertura vegetal nativa, dados da Embrapa e comprovados por organismos como a Nasa. Ou seja, organismos internacionais proveniente dos EUA ou países europeus, que possuem menos de 10% de cobertura vegetal nativa em seus territórios, querem nos ensinar como cuidar da Amazônia, ou biomas como o do Pantanal. Fato é que o Brasil possui uma das legislações mais exigentes do ponto de vista de preservação ambiental do mundo. O debate em torno da questão ambiental e outras questões assemelhadas não pode ser um debate pseudo-ideológico, mas sim em torno da ciência, como um critério para mensurar a capacidade que temos de inovar e os eventuais malefícios que tivermos serem medidos objetivamente e não serem frutos de um discurso ideológico.
O que está faltando para o centro emplacar um candidato para as eleições?
Todos nós sabemos que a convergência democrática é a melhor resposta para aquilo que sociedade necessita hoje, que não é somente eleger uma pessoa, mas eleger uma pessoa que tenha uma base ampla de apoio, que seja capaz de superar o período de radicalização que vivemos na política nacional. Há uma frase que tenho reiteradamente dito: “chega de gladiadores, é hora dos construtores”. Eu acho que isso sintetiza muito aquilo que o meu partido, PPS, formulou no seu congresso nacional e definiu como estratégia para sua intervenção.
O que o senhor pensa desta polarização política que domina o cenário pré-eleições?
Acho que naturalmente a convergência democrática irá se estabelecer ao longo dos próximos meses e assim minar a polarização política existente. Por isso, devemos trabalhar em cima de um programa de unidade, de pontos de consenso, de um candidato capaz de conduzir as reformas necessárias ao país. Temos que debater permanentemente assuntos como a desregulamentação da economia, retomada da concorrência em diversos setores do mercado, a necessidade de um Estado regulador e não provedor. Desta forma, no plano da convergência democrática teremos também o embate com setores mais liberais que existem por aí e devemos enfatizar a necessidade do compromisso social e não apenas econômico.
Quais devem ser, tanto para agricultura, quanto para os demais setores da economia brasileira, as principais plataformas políticas para o país voltar a crescer e gerar empregos?
Acredito de acordo com o que foi dito, que devemos definir os setores que temos mais competitividade e também ter uma visão mais clara das alianças internacionais que o Brasil deverá desenvolver. Do ponto de vista interno, privilegiar setores de uso intensivo de mão de obra, pois hoje temos quase 13 milhões de desempregados. Considerar que o sistema financeiro deve ter redefinido sua vocação para ser efetivamente um fomentador dos investimentos de longo prazo e não simplesmente um setor que viveu da rolagem de títulos públicos. No mais, forte investimento em inovação e políticas públicas voltadas para educação.

sábado, 9 de junho de 2018

Germano Martiniano: Brasil perde uma das maiores esportistas da história, a tenista Maria Esther Bueno

Ex-número 1 do mundo, a tenista paulistana conquistou 19 títulos de Slam e somente ela e Gustavo Kuerten no Brasil integram o Hall da Fama do Tênis

Maior tenista da história do Brasil, reverenciada internacionalmente, ganhadora de 71 torneios, dentre eles, 19 títulos de Grand Slam, Maria Esther Bueno faleceu ontem, sexta-feira (08/06), em São Paulo, vitima de um câncer. A Bailarina do Tênis, como era conhecida devido à plasticidade e habilidade que davam graça ao seu jogo, Maria Bueno lutava contra um câncer desde o ano passado, que se iniciou no lábio e se espalhou pela garganta. Chegou apresentar melhoras, depois de passar por sessões de quimioterapia, contudo, este ano, em abril, a doença se espalhou por outros órgãos do corpo e a ex-tenista não resistiu e veio a falecer no hospital Nove de Julho, na capital paulistana, onde estava na UTI há alguns dias.
Mesmo internada e em estado grave, Maria Esther continuava lúcida e não se cansava do esporte que a fez uma lenda. Na terça-feira, inclusive, assistiu ao jogo entre o sérvio Novak Djokovic e o italiano Marco Cecchinato pelas quartas de final de Roland Garros. Essa paixão pelo tênis, que levou até a morte, se iniciou ainda menina, no Clube de Regatas Tietê, na zona norte de São Paulo, na companhia do irmão mais velho, Pedro. Em 1954, com 14 anos, foi então que a tenista começou a mostrar seu potencial ao ganhar vários torneios pelo Brasil contra adversárias mais velhas.

terça-feira, 5 de junho de 2018

Entrevista: Marcus Pestana

Um dos autores do Manifesto por um polo democrático e reformista, que será lançado nesta terça-feira (05/06) em Brasília, Pestana diz que a iniciativa surgiu da necessidade de se encontrar um caminho entre o “desastre e a catástrofe política”, citando frase do senador Cristovam Buarque

Por Germano Martiniano
Em um ano em que milhões de brasileiros irão eleger um novo presidente da República, a esperança de propostas políticas progressistas e que girem em torno de um ambiente reformista e democrático ainda está assentada no centro democrático, que no atual momento se encontra bastante fragmentado. De Marina Silva ao governador Geraldo Alckmin, nenhum candidato conseguiu emplacar candidaturas fortes. Por quê? E quais propostas devem estruturar e unir o centro democrático para fazer frente ao radicalismo que tem imperado em nossa política? São essas respostas que o “Manifesto por um polo democrático e reformista” busca dar à população brasileira. Sob a iniciativa do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, do senador Cristovam Buarque (PPS-DF), do ministro Aloysio Nunes Ferreira e do deputado federal Marcus Pestana (PSDB-MG), o Manifesto será lançado nesta terça-feira (05/06), em Brasília, às 16h, no Café do Salão Verde da Câmara dos Deputados.
A série FAP Entrevista desta semana é com o deputado federal Marcus Pestana, um dos autores do Manifesto e ex-presidente do PSDB de Minas Gerais. Ele lembra como surgiu a ideia de se criar o Manifesto: “A iniciativa de criar o Manifesto surgiu de uma conversa minha com o Senador Cristovam Buarque”, disse. “Decidimos nos movimentar frente à fragmentação das forças democráticas”, concluiu Pestana, citando uma frase do senador pelo PPS-DF para sintetizar a situação: “Precisamos encontrar um caminho entre o desastre a catástrofe, por isso tivemos essa ideia que contou com o apoio entusiasta de FHC, Aloisio Nunes e mais trinta signatários.”
Formado em economia, Marcus Pestana iniciou sua vida política como vereador de Juiz de Fora (MG) em 1983. Em 2006, foi eleito deputado estadual, porém se afastou do cargo em 2007, quando se tornou secretário de Estado da Saúde de Minas Gerais. Em 2010 foi eleito deputado federal, reeleito em 2014. Nesta função votou a favor do impeachment de Dilma Rousseff e também da Reforma Trabalhista. Em 2013 foi avaliado pela revista Veja como o segundo melhor deputado federal do país naquele ano. A entrevista integra uma série que a FAP está publicando, aos domingos, com intelectuais e personalidades políticas de todo o Brasil, com o objetivo de ampliar o debate em torno do principal tema deste ano: as eleições.
Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista:
FAP Entrevista – Como surgiu e de quem foi a ideia de realizar o Manifesto “Por um polo democrático e reformista”?
Marcus Pestana – Inicialmente partiu de uma conversa minha com o Senador Cristovam Buarque. Decidimos nos movimentar diante da perspectiva de fragmentação das forças democráticas e reformistas e de um segundo turno nas presidenciais, como disse o Cristovam, entre o desastre e a catástrofe. Esboçamos o Manifesto, como ponto aglutinador, e submetemos ao FHC e ao Aloisio Nunes Ferreira que apoiaram com entusiasmo. A partir daí, consolidamos a lista inicial de 30 signatários para o lançamento no próximo dia 5/6, próxima terça.
O país encontra-se, atualmente, polarizado entre o populismo autoritário de direita e o de esquerda. Onde foi que o centro democrático errou e por que chegamos a tal polarização?
Não conseguimos enraizar a perspectiva democrática no seio da sociedade. Seguimos um modelo de organização partidária tradicional e deixamos brechas pra sobrevivência dos populismos autoritários. A Lava-Jato, ao revelar o submundo do sistema, jogou todos na vala comum. Há um abismo separando a sociedade e sistema político. Neste espaço os populismos nadam de braçada, oferecendo saídas simples, fáceis, boas de serem ouvidas, mas equivocadas para problemas complexos. O quadro político tradicional frustrou a sociedade e aí surgem os aventureiros.
Como será o trabalho do Manifesto após seu lançamento e como fazer com que o mesmo alcance a sociedade?
Vamos procurar todos os pré-candidatos e direções partidárias identificadas com esse campo de ideias, dos liberais aos socialdemocratas e socialistas democráticos. Dialogar para ver como produzir a urgente e essencial unidade política e eleitoral.
O Manifesto visa uma ampla unidade política contrária à disseminação de discursos radicais. Como unir candidatos presidenciais por uma mesma bandeira?
A união pode se dar já nas convenções, com a convergência em torno de um candidato que represente o polo democrático. Pode se dar também ao longo do processo do primeiro turno, com candidatos pior posicionados retirando seus nomes e apoiando quem estiver melhor se o apocalipse se anunciar a 20 ou 15 dias da eleição. Ou a unidade pode se materializar no segundo turno. O problema é se o campo democrático estiver ausente, hipótese que não pode ser afastada, ao contrário, hoje seria a mais provável.
A greve dos caminhoneiros expôs a crise financeira pela qual o Estado brasileiro passa. Para o senhor, quais as mudanças prioritárias para economia brasileira?
Sem equilíbrio fiscal não haverá a manutenção de baixas taxas de inflação e juros. Portanto, sem responsabilidade fiscal não haverá crescimento, investimentos e geração de emprego e renda. A Petrobras é uma empresa de capital aberto, com acionistas minoritários e regras de mercado. Quando se quer subsidiar algo deve ser por meio de subsídio explícito, no orçamento, com custo definido e decisão transparente e democrática. Sem as reformas tributária, fiscal, previdenciária e política, o Brasil não irá longe.
Como o senhor avalia uma possível aliança do governador Geraldo Alckmin com o MDB para disputar a presidência? Não seria continuar com mais do mesmo?
O ex-governador Alckmin tem experiência, competência comprovada, serenidade e capacidade de diálogo. Tem o perfil que o Brasil precisa. Mas isto é uma construção política. O fundamental são as ideias e a unidade do campo democrático. O BLOCO DEMOCRÁTICO é suprapartidário e tem compromisso com uma visão de futuro e não com nomes. O MDB tem uma lógica própria, está no poder e legitimamente quer defender o legado de Michel Temer.
Alckmin poderia ser o nome adequado para realizar as mudanças apontadas no Manifesto?
O perfil é perfeito para liderar o processo de reformas e mudanças. Mas temos que agregar o campo democrático e ganhar as eleições. O Brasil vive tempos sombrios e instáveis. É uma loteria a eleição de 2018.
Existe um clamor na sociedade brasileira por renovação política, por mudanças que o próprio Manifesto apontou. Contudo, muitas das mudanças necessárias ao país esbarram nos interesses dos grandes partidos como PT, PSDB e MDB. A reforma eleitoral e a distribuição desigual dos repasses financeiros é um exemplo. Como quebrar essas velhas estruturas de poder, que desejam deixar tudo como está?
Renovar por renovar não faz sentido. Oxigenar o sistema é ótimo. Mas para os desafios complexos que temos pela frente, experiência é fundamental. Mesclar renovação com experiência é o caminho. O futuro está na mão do cidadão. Não há saída sem democracia. A ameaça autoritária tanto na matriz bolivariana quanto na proto-fascista tem de ser derrotada. O mistério é descobrirmos o caminho da vitória do polo democrático e reformista.