domingo, 22 de abril de 2018

Entrevista com Luiz Sergio Henriques

Para Henriques um dos grandes males da politica nacional brasileira é a atual polarização da sociedade. “Aos poucos perde-se a noção, absolutamente essencial, de que pode haver um bem comum, nutrido, evidentemente, por ideais de liberdade”

Por Germano Martiniano
O entrevistado desta semana da série FAP Entrevista é Luiz Sérgio Henriques, tradutor e ensaísta. Com uma ampla participação em jornais e revistas associados ao velho PCB, como Voz da Unidade e Presença, na Fundação Astrojildo Pereira dirige a coleção Brasil & Itália, que trouxe para o público brasileiro livros inéditos de Giuseppe Vacca, Silvio Pons e outros. Coeditou, com Marco Aurélio Nogueira e Carlos Nelson Coutinho, as Obras de Antonio Gramsci, lançadas pela Editora Civilização Brasileira. Há vários anos é colaborador regular de O Estado de S. Paulo. Edita o site Gramsci e o Brasil e a página Esquerda Demócratica (que podem ser acessados por meio dos links www.gramsci.org e https://www.facebook.com/esqdemocratica, respectivamente). Esta entrevista faz parte de uma série que a FAP está publicando, aos domingos, com intelectuais e personalidades políticas de todo o Brasil, com o objetivo de ampliar o debate em torno do principal tema deste ano: as eleições.
Para Henriques, um dos grandes males da politica nacional brasileira atualmente é a polarização da sociedade. “Aos poucos perde-se a noção, absolutamente essencial, de que pode haver um bem comum, nutrido, e níveis menos escandalosos (bem menos!) de desigualdade social e regional”, avalia.
A democracia está sob ataque, no cenário internacional, acredita Luiz Sérgio Henriques. “A Europa do compromisso social-democrata sofre um assédio dos dirigentes ditos ‘populistas’, Evidente, ainda, a crispação dos Estados Unidos sob Trump, que parecem recuar desordenadamente para o interior das suas fronteiras e abdicar das instituições multilaterais que ajudaram a formar, em primeiro lugar a ONU”, avalia o especialista em Gramsci.
Confira, abaixo, os principais trechos da entrevista com Luiz Sergio Henriques:
FAP – O jornalista William Waack, nesta semana, escreveu um artigo que analisa a pobreza do atual debate político brasileiro que, praticamente, se restringe ao tema da corrupção, mas que se preocupa muito pouco com outras questões essenciais a sociedade. O senhor concorda com essa visão e quais seriam as questões essenciais a serem debatidas?Luiz Sergio Henriques – Pode-se evidentemente ter uma visão pobre sobre o problema da corrupção, supondo que ela seja o tal câncer que corrói a nação, superado o qual nos tornaríamos uma Escandinávia dos áureos tempos. Tradicionalmente, a esquerda chamou esta visão de “udenismo”, um moralismo convencional e muitas vezes hipócrita. Mas a pegada udenista não é a única possível. Há problemas de moralidade pública quando um partido de governo ocupa a máquina pública com a ideia de se autorreproduzir indefinidamente, pelo menos em princípio. Ou quando, inversamente, um partido de oposição se comporta de modo irresponsável, educando ou deseducando os seus seguidores com exigências radicais, que não poderá satisfazer uma vez no governo. A correta relação com as instituições, o tema do bom governo, o ativismo governamental em favor dos mais desfavorecidos, com boas e eficientes políticas públicas – nada disso é udenismo. Recordo que outrora o petismo se considerava o monopolizador da ética na política. À luz do que aconteceria depois, podemos dizer que se tratava de uma versão particularíssima do udenismo, que não resistiria ao contato com a vida real.
O ex-presidente Lula teve mais um recurso de defesa negado pelo TRF-4, em Porto Alegre, nesta última semana. O Partido dos Trabalhadores e seus simpatizantes continuam com o discurso de que Lula é um preso político. Como o senhor avalia esse discurso?
Saímos de uma ditadura de fato em 1985. Embora haja novas e novíssimas gerações que não viveram aquele pesadelo, todos sabemos muito bem o que é um preso político, o que é a tortura, o exílio, o morto sem sepultura. Acostumamo-nos, por exemplo, a ler os relatórios de ONGs que respeitávamos, como a Anistia Internacional e a Human Rights Watch, que faziam a denúncia global dos crimes e arbitrariedades políticas aqui cometidos. Nada disso está presente hoje. Os relatórios internacionais falam (e devem mesmo falar) das nossas infelizes chagas “costumeiras”, como os 60 mil assassinatos anuais, a violência policial, a violência contra os bons policiais, os cárceres desumanos, mas não denunciam nenhum regime ditatorial, nem poderiam. O ex-presidente Lula, tal como Eduardo Cunha ou Sérgio Cabral, é apenas um político preso, por mais que conte com uma massa considerável de adeptos e seguidores mais ou menos convictos que jurem de pés juntos que ele é um perseguido. Existe em nosso país a separação plena de poderes, o Judiciário não é um ramo subordinado a partidos ou governos. Sem fazer qualquer juízo de mérito, constato que o Executivo tem à frente um político extremamente impopular, que não teria a mínima força para dar um golpe ou um autogolpe e instaurar um regime de exceção. As Forças Armadas comportam-se nos termos constitucionais. Elas se atualizaram e até participaram de missões em defesa dos direitos humanos, como no Haiti, sob a bandeira da ONU. Não há mais a guerra fria, apesar da polarização desastrada que atravessa a nossa sociedade. O calendário eleitoral não pode ser rasgado e há plena liberdade de organização partidária, como é natural que haja quando comemoramos os 30 anos da nossa mais avançada Constituição.
Em seu último artigo, o senhor citou que nenhuma sociedade poderia superar suas contradições mais agudas dividida em “metades inconciliáveis”. O Brasil atual, inflamado pelo discurso petista e também de Bolsonaro, vive grande polarização política. Como acabar com essa divisão?
A divisão de uma sociedade ao longo de linhas mais facciosas do que partidárias é uma maldição. Aos poucos perde-se a noção, absolutamente essencial, de que pode haver um bem comum, nutrido, evidentemente, por ideais de liberdade e níveis menos escandalosos (bem menos!) de desigualdade social e regional. A recuperação da ideia de bem comum deveria ser a tarefa essencial de todos os democratas, sem maiores distinções. Como estamos situados numa determinada faixa do espectro político, que é a esquerda, pessoalmente gostaria que esta mesma esquerda, ou sua parte majoritária, assumisse um papel de protagonista na construção e consolidação do terreno comum. Isto simplesmente não foi possível com o lulismo e o petismo, que se articulou em torno de esquemas simplórios, como aquela terrível imagem de “casa grande” e “senzala”. Seriam escravocratas, homofóbicos, xenófobos ou misóginos – em suma, moradores da casa grande – todos os não-petistas e mesmo os antipetistas, o que está muito distante de corresponder à realidade. Ou, para falar a verdade, significa uma monumental distorção dos fatos. Basta olhar ao nosso redor e ver que, fora dos limites estreitos da militância e do fanatismo, há pessoas sensatas, razoáveis, que se preocupam com o futuro delas e do país. E estas pessoas são a maioria. A grande política, hoje, significaria dar voz a elas, na multiplicidade de suas exigências e demandas, relegando às margens os incendiários de todo tipo. Esta maioria abomina a extrema-direita truculenta que alguns hoje querem “normalizar”.
Outro ponto de destaque em seu artigo foi que “nenhuma esquerda podia mais pôr em questão, para se credenciar a um papel dirigente, a dialética democrática”. O senhor acha que o PT, mesmo com a prisão de Lula, ainda representa uma ameaça à esquerda democrática brasileira, e em um sentido mais amplo, à democracia brasileira?
Dirigir um país é ter políticas e programas para todos. É buscar exaustivamente o consenso ativo dos governados, recomeçando a cada dia esta tarefa interminável. É falar a verdade, dar explicações constantes e, de repente, aprender. É preciso ter um alto sentido de Estado e das suas instituições. Agir no parlamento e em todos os demais fóruns como um fator de modernização, participação e transparência. Como, a meu ver, não temos nenhuma outra bússola a não ser a Constituição de 1988, fico incomodado quando em reiterados documentos oficiais o principal partido de esquerda volta a defender assembleias constituintes inteiramente extemporâneas. Há poucos dias um de seus notórios representantes apregoou “o fechamento do STF”, o que me parece de um sectarismo sem par, que não ficaria deslocado na boca de algum porta-voz daquela extrema-direita que mencionei. Por ocasião dos acontecimentos de 2005, o “mensalão”, houve vozes dentro do PT que falaram em refundação do partido. Vozes fracas, é verdade, mas houve. Nestes últimos meses tenho tentado observar movimentos, mesmo mínimos, na direção de uma autocrítica e de uma vontade de dar início a uma reflexão menos precipitada sobre a política e sobre o nosso país. Em algum momento, o PT terá de enfrentar esta realidade e ver a sua própria cara no espelho, sem condescendência de nenhum tipo. Hoje o partido parece perdido entre a agressividade e o instinto de defesa a qualquer custo. Isto não anuncia nada de bom nem para o partido nem para o nosso país.
Quais partidos políticos representam, atualmente, no Brasil, uma esquerda democrática e qual deve ser o papel dos mesmos?
Não gostaria de citar este ou aquele partido até pelo quadro extremamente caótico do sistema. Praticamente todos os partidos, uns mais, outros menos, estão sendo atingidos pelas múltiplas investigações em curso, o que não deixa de ter o seu lado extremamente perigoso. Afinal, não custa lembrar que não há democracia sem partidos. Agiram e continuam a agir fatores muito potentes de desagregação. Limito-me a citar a espantosa janela de infidelidades, que, efetivada a poucos meses das eleições gerais de 2018, quis “corrigir” o resultado das urnas de 2014, fazendo com que detentores de mandato mudem de sigla até mais de uma vez ao sabor dos leilões do fundo partidário e eleitoral. Há muitas razões, assim, para o cidadão não sentir um vínculo maior com o deputado que deveria ser “seu”, mas não é. Há bons deputados espalhados nas várias agremiações de centro-esquerda e centro-direita, e será interessante ver em ação os novos mecanismos “centrípetos” recentemente aprovados, como a cláusula de desempenho e, mais à frente, a proibição de coligações nas eleições proporcionais. Haverá incentivo para que iguais e afins se juntem em grupos mais consistentes, interrompendo a lógica de criação indefinida de simulacros de partidos. Não se consegue implantar um sistema pronto e acabado, como num experimento controlado em laboratório, mas é evidente que ainda estamos longe de resolver o tema crucial do financiamento das atividades partidárias. Ele deve ser público, privado ou uma mistura de ambos? Na época digital, limites de custos de campanha e controle dos recursos empregados se tornam uma imposição. Não é possível que a política seja uma alavanca para a riqueza privada daqueles que vivem da política, não para a política. Já num plano mais substantivo, é de se esperar que as novas agremiações que resistirem ao teste da barreira mínima de votos e da proibição de coligações se tornem menos ideológicas e mais programáticas. Nunca houve nem haverá uma só solução para cada um dos nossos imensos desafios, e é fundamental que os partidos, em número bem mais contido do que os de hoje, saibam elaborar as diferentes soluções possíveis a partir da diversidade de interesses que existem na sociedade. Convém lembrar, contudo, que sairá vencedor aquela condensação de interesses que se elevar até o plano geral, rompendo o egoísmo e o corporativismo. Um desafio para uma futura esquerda renovada.
O conflito na Síria, além de colocar em choque grandes nações, também evidencia ainda mais o advento de governos autoritários, além de discursos hostis. A democracia no ocidente está em risco? O senhor considera a possibilidade de outra grande guerra?
A democracia política é um conjunto de valores e instituições herdados do liberalismo clássico e progressivamente ampliados pela ação de classes e setores subalternos, ao longo de séculos de lutas muitas vezes duríssimas e até cruentas. O sufrágio universal, por exemplo, não foi o resultado de belo sonho de uma noite de verão. Muito menos o sindicalismo autônomo e a própria forma-partido. Por isso, é fácil perceber que a democracia é um patrimônio coletivo que permite o desenvolvimento da política como persuasão, como consenso, como luta social muitas vezes áspera, mas dentro de parâmetros definidos, sem descambar para a guerra de todos contra todos. Este conjunto de regras está hoje sob ataque. A Europa do compromisso social-democrata sofre um assédio dos dirigentes ditos “populistas”, com sua capacidade preocupante de dar uma resposta – por mais ilusória e regressiva que possa ser – ao desenraizamento trazido pelo fenômeno perturbador da globalização. Evidente, ainda, a crispação dos Estados Unidos sob Trump, que parecem recuar desordenadamente para o interior das suas fronteiras e abdicar das instituições multilaterais que ajudaram a formar, em primeiro lugar a ONU. Na América Latina, não foram poucas as ameaças trazidas pelo bolivarianismo, cujo projeto de “socialismo do século XXI”, essencialmente autoritário, contribuiu para desonrar uma vez mais os conceitos de esquerda e de socialismo. Ao mesmo tempo, vivemos possibilidades imensas, com o avanço da ciência, a transição energética e a revolução nas tecnologias de comunicação e informação. Todo e qualquer progresso traz em si novos dilemas éticos, que nem sempre conseguimos formular e decifrar no calor da hora. A sensação é que os fatos continuam a correr na frente da nossa capacidade de dirigi-los e ordená-los minimamente. No fundo, tudo isso é um conjunto de grandes desafios que podem revitalizar e dar substância à política democrática.
Em Cuba, Raul Castro cedeu a presidência a Miguel Diaz Canel, 57 anos, nascido após a revolução de 1959. Qual o significado e o peso dessas mudanças?
Sob muitos aspectos, Cuba é um legado de um mundo que já passou. Sua revolução, que deixou traços duradouros na imaginação da esquerda, hoje é um mito com reduzida capacidade expansiva além dos círculos irremediavelmente presos ao passado, o que, aliás, é um direito de quem quer se deixar prender desta maneira. No entanto, não creio que se deva pensar o socialismo como contraposição de países ou de “sistemas”. Ou como algo que se encarna num país ou noutro e que resiste ao capitalismo dos demais. Este é um caminho que deu em nada no passado e previsivelmente não nos levará longe no futuro. Já houve gente que viu o socialismo realizado na Albânia, contra todo o resto do planeta. Por sinal, mais importante do que Cuba é, seguramente, a China (e a Índia), cujo ritmo de expansão não se deteve nestes últimos anos de crise. E a China é, rigorosamente, um animal que não sabemos classificar, uma espécie de unicórnio do século XXI: sob a roupagem do comunismo tradicional do século XX (haja vista a recente entronização de Xi Jinping à frente do partido-Estado), desenvolve-se um mercado poderoso e omnívoro, ainda não contrabalançado por sindicatos ou outras formas associativas livremente organizadas. Mais uma das múltiplas esfinges que nos espreitam todo o tempo.

quarta-feira, 18 de abril de 2018

Demétrio Magnoli: Lula não é um preso político

De Delúbio a Lula, passando por Dirceu e Palocci, todos os condenados petistas foram declarados presos políticos pelo PT –e, no caso de Lula, o PSOL aderiu à prática. Mas PT e PSOL não inscrevem Sérgio Cabral, Eduardo Cunha, Geddel ou Maluf no mesmo círculo




- Folha de S. Paulo


PT e PSOL não se opõem à subordinação da Justiça ao governo, com a condição de que seja o seu governo

terça-feira, 17 de abril de 2018

Merval Pereira: Marina na disputa

A pré-candidata da Rede diz que “não precisa reinventar a roda” para fazer um plano de governo eficiente: “Recuperar os fundamentos da política macroeconômica do Plano Real e aprofundar a inclusão social, indo para os programas sociais de terceira geração com inclusão produtiva e com políticas sociais customizadas”.
Merval Pereira


A ex-senadora Marina Silva surge como a grande beneficiária da saída do ex-presidente Lula da campanha presidencial na mais recente pesquisa do Datafolha. Está empatada tecnicamente na liderança com o deputado federal Jair Bolsonaro e à frente de políticos tradicionais com fortes estruturas partidárias, como Geraldo Alckmin do PSDB e Ciro Gomes do PDT.

terça-feira, 10 de abril de 2018

Punto Continenti: Prisão de Lula? Inevitável, diz Alberto Aggio

Em entrevista ao jornalista Rainero Schembri, do portal de notícias Punto Continenti (http://puntocontinenti.it/), da Itália, o professor e historiador Alberto Aggio comenta a prisão do ex-presidente Lula, no último sábado (7). Lula foi condenado a 12 anos e um mês de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro.  Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista.

Professor Alberto Aggio, o que se pode dizer da prisão de Lula?
Alberto Aggio – A prisão do Lula é o resultado normal de um país que quer ver preservada a justiça, que quer ver o Brasil como, de fato, um país republicano no qual a lei é igual para todos. É evidente que trata-se de um caso muito particular. Pela primeira vez na história um ex-presidente é julgado, condenado e preso por um crime comum. Lula não é um preso político. Essa é uma narrativa que não se sustenta. Ele negociou ativos de todos os brasileiros, quando era presidente, para benefício próprio. E, esse processo pelo que foi condenado é apenas um deles, há mais processos nesse sentido contra o ex-presidente.

segunda-feira, 9 de abril de 2018

Entrevista com Cristovam Buarque

O senador Cristovam Buarque (PPS-DF) é reconhecido, nacionalmente e internacionalmente, por seus esforços e inúmeros trabalhos por uma educação de qualidade no Brasil, que vão desde diversos livros e artigos publicados sobre o tema, até a ocupação de cargos de alto escalão, como Ministro da Educação e reitor da Universidade de Brasília (UNB)

Por Germano Martiniano
O entrevistado desta semana da FAP Entrevista é o senador e presidente do Conselho Curador da Fundação Astrojildo Pereira (FAP), Cristovam Buarque (PPS-DF). Oriundo de Recife (PE), é engenheiro mecânico, economista, educador, professor universitário e político filiado ao Partido Popular Socialista (PPS). Também foi reitor da Universidade de Brasília (UNB) de 1985 a 1989 e governador do Distrito Federal de 1995 a 1998. A entrevista faz parte de uma série que está sendo publicada, aos domingos, com intelectuais e personalidades políticas de todo o Brasil, com o objetivo de ampliar o debate em torno do principal tema deste ano: as eleições.

sexta-feira, 6 de abril de 2018

O STF, o Judiciário, a crise

Um poder dividido é inoperante e devassável
Ao rejeitar, no início da madrugada de 5 de abril, o pedido de habeas corpus de Lula, por 6 votos a 5, o STF ensaiou uma recuperação de sua imagem. Numa longa e extenuante sessão que se se estendeu por mais de dez horas, a Corte reiterou a jurisprudência consagrada desde 2016 e liberou o caminho para a continuidade da Lava Jato, com a possibilidade de prisão de Lula. Exibiu à opinião pública suas divisões internas e seus ritos de difícil compreensão, mas recuperou a condição de parâmetro normativo, que ameaçava perder em virtude de suas oscilações e do ruído provocado por alguns de seus integrantes. Ao mesmo tempo, pacificou momentaneamente o sistema de Justiça.

O problema, porém, está longe de poder ser considerado resolvido. O Judiciário é hoje um poder em busca de estabilização e de legitimação social. Cercado por todos os lados, por dentro e por fora, flutua entre pressões do mundo político-partidário, expectativas sociais e reivindicações corporativas, que sobrecarregam a agenda e criam tensões recorrentes.